Síntese Crítica: "Lincoln"

18:30:00 Unknown 6 Comments


Acho que o Spielberg está a ficar caduco, assim como a sua filmografia, porque além de não saber a diferença entre robots e et's (Guerra dos Mundos ftw), também não sabe a diferença entre emoções e sexualidade duvidosa (Lincoln, SPOILER: momentos em que o Lincoln dá a mão a gajos e depois põe-se em poses nada favoráveis para a sua masculinidade). Sim, agora, vou falar do filme. Não é totalmente mau, mas entre os clichés e momentos forçados, palha e mais palha gratuita para comover, com a soundtrack a revelar isso momentos antes, assim como deixas nada originais e fora do contexto (como o sarcasmos e moralismos do presidente dos EUA, que parece mais uma espécie de síndrome de Tourette), o filme, daquele que nos fez sonhar de olhos abertos, com obras como ET e Lista de Shindler, está muito aquém do esperado, principalmente para receber 12 nomeações ao Oscar.

No entanto, tem momentos até agradáveis, boa fotografia e cenários - apesar de o jogo de luzes por vezes não resultar devido à sobrexposição de algumas cenas.

Mesmo assim, algumas personagens, como a do Tommy Lee Jones têm a sua particularidade e peso no filme, mesmo que não o torne elementar, por isso, mas dá-lhe alguns pontos, naquilo que no conjunto de cerca de duas horas e meia não foi propriamente um mar de genialidade, ou de cinema que não provoque um tédio brutal e falta de seriedade para encarar as cenas/narrativa, por serem, por vezes, extremamente mal confeccionadas pelo realizador, e não nos permitirem "enganar" e crer nas acções e discursos metafóricos, usados tantas vezes que não tenho dedos para contar que ao longo do filme cansa e o desfalca.

A nível histórico estaria muito bem, se mais uma vez não fosse apenas dado o ponto de vista enviesado americano. A escravatura é um tema bastante importante, também tratado no seu colega na corrida aos Oscares, Django Unchained, mas que este último consegue melhor explorar, de uma forma racional e que mostra as várias partes envolvidas. Ao passo que em Lincoln, os escravos praticamente não têm voz, o que importa não é a causa, mas os sentimentos dos "pobres" americanos caucasianos, mais uma vez o foco está na política e personalidades com poder, em vez de estar no lado daqueles que sofreram os danos provocados pelo estigma dos brancos que lá chegaram.

Há ainda surpresas no que toca ao cast, Joseph Gordon-Levitt, que infelizmente aparece por breves momentos. Embora Daniel Day-Lewis seja bom actor, o papel de Lincoln não me pareceu constar de uma das suas melhores interpretações, tendo em conta as nomeações acumuladas para a recepção da estátua dourada e parecer esforçar-se demais para encarar uma personagem/personalidade criada pela América, como se fosse um herói. É um bocado triste perceber que nem o cinema está livre desta influência política e fanatismo, que é alimentada como se de uma "delusion" se tratasse, e arrasta milhares de pessoas.

Todavia, existem marcas spielbergerianas. Como a última cena, em que é a criança que mostra a emoção vivida no momento, em vez de aparecer o próprio momento; querem mais Spielberg do que isto? Tal como temas o diálogo entre os soldados logo no início e uma sequência de três planos de Lincoln a discursar perante a mulher, que lhe valeram, provavelmente a receita para o Oscar.

Um outro ponto extremamente irritante e usados pelos menos cinco vezes no filme, é a situação de aparecer o Lincoln ou outras personagens do nada, já estando presentes na cena, mas sem o percebermos por o ângulo em que está a ser filmado não o permitir. É giro, concordo, mas uma vez ou duas é uma meia dúzia é outra, sendo cansativo.

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May the force be with you!

Síntese Crítica: "Django Unchained"

03:05:00 Unknown 1 Comments


Em Django Unchained o branco quer sangue, isto de todas as formas possíveis e imaginárias que se possam lembrar. É um filme de peso, visualmente espantoso, um ritmo impressionante, com um cast de valor, soundtrack divina e bem usada, para não falar das deixas/diálogos, como é de praxe, geniais. Por este filme tenho apenas de agradecer a alguém: Obrigado, Senhor Tarantino! Que venham muitos mais como este!

Django: I like the way you die, boy!

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II Parte - Estudo de Caso: Blogosfera de Cinema

17:47:00 Unknown 4 Comments


3.2.      Apresentação de Resultados
3.2.1. A importância da blogosfera de cinema
Para este estudo de caso, em particular, importa estudar a blogosfera de cinema. Uma comunidade que começou sem caras, quase anónima, mas que em poucos anos cresceu, mudou e se uniu, como explicam aqueles que a integram, os cinebloggers. A sua crescente profissionalização veio converter estes espaços inicialmente pessoais em espaços mais profissionais, tal como aconteceu com alguns blogues dedicados a outras temáticas. “A literatura, o cinema, o teatro, a música e as artes em geral, têm encontrado na blogosfera importantes espaços de divulgação e de crítica” (Rodrigues, 2006:126).
Na blogosfera de cinema, depois da sua maturação, os bloggers começaram a agir como uma comunidade: passaram a interagir entre si, reunindo-se em festivais, visionamentos de filmes e numa cerimónia oficial para homenagear os seus pares. Têm conseguido ainda angariar mais leitores do que os media impressos especializados na sétima arte, que se têm extinguido nos últimos anos. Com estas mudanças, ao contrário do que tende a acontecer na blogosfera generalista, os blogues de cinema passaram de complementos aos media tradicionais para alternativas aos mesmos. Desta forma, torna-se crucial perceber exactamente qual o papel dos cineblogues nacionais e como eles evoluíram desde o seu surgimento até a actualidade. Como veremos ao longo do estudo, estes têm um papel cada vez mais reconhecido pelos seus pares e entidades oficiais da área do cinema – como produtoras, directores de festivais e distribuidoras. O que é um fenómeno intrínseco ao assunto que trata - o cinema -, visto não se evidenciar o mesmo noutras esferas da blogosfera, pelo menos com a mesma intensidade. Por isso, nas páginas que se seguem serão apresentados e discutidos os resultados desta investigação com o objectivo de chegar a algumas conclusões sobre o assunto em estudo.

3.2.2.  O despertar da blogosfera de cinema
Foi em 2003, que a blogosfera de cinema deu os seus primeiros passos. De acordo com os relatos dos próprios bloggers, por ser um fenómeno ainda exíguo, não era comum estes conhecerem-se pessoalmente. Quem o recorda é JB Martins, autor do Cineblog, o blogger de cinema português mais antigo ainda em actividade, desde 2003: “Éramos três. O Cineblog, o Antestreia [do Nuno Reis] e o Arquivos de um Cinéfilo [do Vasco Martins]. E pouco tempo depois surgiu o Hollywood [do Miguel Pereira] e o CinemaXunga [do Pedro Cinemaxunga - pseudónimo].”
Ao mesmo tempo que surgiam novos blogues, pouco a pouco, os bloggers foram-se conhecendo, adicionando na blogroll – lista de links de referência presente em cada blogue – e interagindo. De desconhecidos passaram a companheiros, e rapidamente a blogosfera da especialidade foi crescendo e unindo-se, de acordo com os relatos dos vários bloggers entrevistados.
Em 2004, dois bloggers, JB Martins e Miguel Lourenço, tiveram a ideia de criar um projecto pioneiro, que daria um tom mais sério ao trabalho efectuado pela comunidade, uma espécie de academia – o ABCine. Mas esta não teve os resultados esperados. “Na altura a vida dos blogues era efémera e a identidade dos seus autores ainda era pouco conhecida”, explica o autor do Cineblog.
A par da academia, muitas foram as parcerias intrabloggers efectuadas nesses primeiros anos. O dinamismo tomou conta deste fenómeno nos seus primórdios. Como defendem muitos especialistas de novos media, nos primeiros anos de 2000, os blogues atingiram uma fasquia de adesão e desenvolvimento admiráveis. Numa apresentação preparada para o IV Encontro de bloggers[1], o jornalista especializado em novos media, Paulo Querido, fala exactamente desse fenómeno de crescimento e de mudança pelo qual a blogosfera passou (Querido, 2008). Este destaca o período que vai de 2003 a 2007 como uma altura em que a blogosfera se caracterizava por uma grande “energia, inovação, entusiasmo, espírito pioneiro, sentido de comunidade e interferência na agenda dos media(Querido, 2008:18). Verificamos já aqui um dos primeiros sinais que indicam a aproximação do papel dos blogues ao dos media, mesmo que nesta altura os blogues de cinema ainda não fossem vistos de um ponto de vista profissional, como acontece actualmente. Contudo, nesta altura já a Internet e os blogues de cinema marcam uma importante viragem para o papel do cidadão-comum, pois permitem que este passe de apenas leitor passivo para autor de um espaço com publicações:
“Diferentemente dos outros meios de comunicação, nos quais os usuários assumem uma posição passiva, que pode ser percebida até mesmo pelo nome como são chamados – ouvintes, leitores ou telespectadores, na rede não existe um público unicamente receptor. Não só por poder comentar o que lê, escuta ou vê, mas por poder produzir seus próprios conteúdos, o público dos novos meios de comunicação assume uma postura diversa da que era assumida até então” (Passos, 2009: 2).

3.2.1.   “Os loucos anos 20 da blogosfera de cinema”
De acordo com o testemunho de vários bloggers, recolhido a partir das entrevistas e da realização de uma reunião do grupo Bloggers Cinéfilos do Facebook, em pouco mais de cinco anos a blogosfera de cinema atingiu um crescimento admirável. Começou a ser difícil distinguir tantos espaços, as blogrolls ficaram extensas e quase todos os dias aparecia um novo blogue, criando-se relações sociais entre eles. “Essa interação mútua sugere a construção de relações sociais, formando comunidades virtuais” (Mauad, 2009:3).
 De 2003 a 2007, a blogosfera de cinema tornou-se uma comunidade, repleta de novas tendências e grandes mudanças. Como reitera André Marques, autor do Blockbusters, “havia muitas iniciativas intra-blogues, parcerias, novas ideias; era uma espécie de loucos anos 20 da blogosfera do cinema”. Nasciam e morriam à velocidade da luz novos espaços. As razões de quem criava um blogue de cinema eram muitas, mas com um ponto em comum: o amor ao cinema e a vontade de partilhar com o mundo os seus pensamentos. Como exemplo temos os testemunhos de alguns bloggers. Samuel Andrade, autor do blogue Keyzer Soze’s Place, nascido em 2004, explica que o seu espaço foi criado “pelo puro prazer de escrever e reflectir sobre cinema.” Já Nuno Reis, autor do Antestreia, blogue criado em 2003, conta que “o espaço foi criado para dois amigos falarem do que gostavam: o cinema”.
Ainda através dos dados recolhidos juntos dos autores dos blogues, pode concluir-se, que a blogosfera de cinema atingiu o seu auge entre 2008 e 2010. Segundo os próprios utilizadores, novas tendências foram surgindo - quer a nível de layouts de blogues, quer de formato de artigos ou mesmo pretensões dos próprios bloggers. Edgar Ascenção, autor do blogue Brain-Mixer, fala dessa vontade de mudança: “Queria exprimir o que sentia no momento sobre o cinema e principalmente distanciar-me de todos os outros blogues da altura quando criei o meu”.
Aos poucos a comunidade foi criando o seu próprio código de conduta e regras. Em 2010, graças à criação de um grupo no Facebook pela mão de Samuel Andrade - Grupo de Bloggers Cinéfilos - foi possível reforçar a interacção entre os bloggers. Todos os dias eram lançados dezenas de tópicos de discussão, adicionados novos membros e criadas iniciativas conjuntas, como é o exemplo da Tertúlia de Cinema, onde cada blogger escolhia filmes para um ciclo temático mensal. Actualmente, o grupo ainda existe. Conta com mais de 100 membros, que obedecem a um conjunto de regras: ter um blogue ou ter um papel activo na área do cinema são algumas das condições necessárias para pertencer ao grupo. De acordo com o blogger Samuel Andrade, “a plataforma foi criada com o propósito de reforçar a troca de ideias sobre cinema e tentar juntar todos os bloggers nacionais de cinema num só lugar”. Algo que vai de encontro às novas tendências de migração dos media e blogues para as redes sociais.
Em menos de uma década, a blogosfera de cinema conseguiu alcançar uma força notável que a maioria das revistas de cinema portuguesas não conquistou e, por isso, hoje apenas há uma em papel: a Empire. Ao contrário das publicações especializadas tradicionais (Mesquita, 2004:47), a blogosfera é constantemente actualizada, mais próxima dos leitores, reúne informação de qualidade escrita voluntariamente, juntando numa mesma comunidade os cinéfilos do cinema de culto com os do cinema mais comercial. De acordo com a entrevista efectuada ao docente da disciplina de Cibercultura, Sergio Denicoli, existem várias razões que explicam a “força” da blogosfera: “Hoje quem confere credibilidade a um veículo é o próprio leitor, de acordo com as suas convicções e experiências. Se ele se identifica com um determinado blogue, se confia em quem está a escrever naquele espaço, ele automaticamente passa a acreditar que o que está ali publicado é credível. E, ao mesmo tempo em que isso acontece, ocorre também o facto de que muitos jornais começam a deixar de ser credíveis aos olhos de alguns leitores que simplesmente não se identificam com a linha editorial, ou não acreditam que a notícia publicada tenha sido bem apurada. Não há mais espaço para apenas uma verdade mediada pelos veículos de massa. Há muitas verdades e o utilizador da Internet vai escolher como fonte aquela que lhe parece mais adequada, dentro dos seus critérios particulares”.
Ao fim de nove anos de existência, os tempos mudaram e a blogosfera de cinema prosperou. Para isso contribuíram também as redes sociais e o surgimento de um elevado número de blogues de qualidade que chamou a atenção. A ideia primordial de criar um destes espaços apenas por paixão ao cinema, para dizer algo ao mundo e partilhar conhecimentos, começou a ser um motivo secundário. Os bloggers mais antigos falam da “perda da inocência” que se tinha nos primeiros anos da blogosfera de cinema. Explicam que os novos bloggers já têm noção das potencialidades, visibilidade e poder dos blogues e usufruem disso para a autopromoção. Em conformidade com esta visão pessimista do estado da cineblogosfera, temos também a opinião de alguns especialistas da área dos novos media, como é o caso de Paulo Querido (2008). Como podemos verificar, nos seus primórdios, os blogues, de um modo geral e universal, eram ligados a características como a de ser um espaço intimista, não profissional, crítico e como uma alternativa aos media tradicionais. O teórico de novos media critica também o facto de que estes perderam a sua peculiaridade, estagnaram, perderam o ritmo, começaram a aproximar-se do formato dos media e a serem indistintos dos mesmos (Querido, 2008). “Mas aflorei ainda aspectos que contribuem para tirar impacto aos blogues (e energia aos autores e leitores). O surto das redes sociais e da participação dos indivíduos nelas, bem como as alternativas editoriais como o microblogging, que é onde agora está a acção”, acrescenta Paulo Querido (2008: s/p). E ainda o teórico Manuel Pinto (2008: s/p), que escreve no seu blogue Jornalismo e Comunicação o seguinte: “De facto, têm sido vários, nos últimos tempos, os sinais de um ‘farewell’, desde que Paul Boutin, escreveu na Wired,  no mês passado, “Twitter, Flickr, Facebook Make Blogs Look So 2004“. A partir daí gerou-se uma onda semelhante à que por duas vezes se levantou no ano passado, sempre a anunciar “the death of blogs”.”.
No entanto, nem tudo é negativo. Também é admitido no texto do investigador Manuel Pinto (2008) que apesar de muitos blogues terem ficado pelo caminho, outros têm surgido e já se fala da sua profissionalização:
Muitos ficam e continuarão a ficar pelo caminho, mas outros surgem e, das sucessivas colheitas, as marcas e as castas vão-se apurando, como no vinho. Enquanto já há quem pergunte “Quem matou a blogosfera“, desejando, curiosamente através de um blogue, que ela descanse em paz, também existe quem descubra nela o seu modo de vida e quem se dedique a estudá-la “(Pinto, 2008: s/p).
Em concordância com estas ideias, também o colunista do Correio da Manhã, Paulo Pinto Mascarenhas (2008: s/p), defende que nem tudo está perdido: ”Uns fecham, há os que estagnam, outros abrem, mas quase nada se perde e tudo se pode transformar. As notícias da morte da blogosfera são manifestamente exageradas”.



[1] IV Encontro de Bloggers, organizado pela Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, de 14 a 15 de Novembro de 2008.


(CONTINUA PARA A SEMANA)

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May the force be with you!

Estudo de Caso - Blogosfera de Cinema

14:22:00 Unknown 3 Comments

Ao longo deste ano, de modo a registar a existência, em particular, da blogosfera de cinema, decidi como tema de um estudo cientifico estudar o caso do papel dos blogues nacionais como meios de divulgação do cinema. Neste sentido, através do auxílio de um grande número de blogues, dos quais seleccionei alguns para incluir directamente neste trabalho, assim como a ajuda de vários órgãos do mundo do cinema - realizadores, distribuidoras de cinema, directores de festivais de cinema, jornalistas, etc - consegui executar este estudo de caso. Os dados foram reveladores por um lado, mas por outro vieram a confirmar muitas das minhas ideias primordiais. Como acho que este é um trabalho escrito não apenas para mim, mas para a blogosfera em geral, marcando assim a passagem de uma era, que provavelmente nunca mais voltará a repetir-se, deixarei, aqui, ao longo de várias semanas, extractos desse mesmo estudo cientifico, esperando da vossa parte um feedback. Espero que tenham em conta que foi feito em pouco tempo, relacionado com os velhos media e não isoladamente, portanto espero que sejam brandos nos julgamentos e apreciem este contributo que aqui partilho.

Obrigada a todos!Espero que gostem desta perspectiva histórica-cientifica do nosso mundo, que é a cineblogosfera. Fica aqui a primeira parte, a contextualização, do estudo. Para a semana sairá uma nova...


2.1.A relação entre os velhos e os novos media
Numa sociedade onde a informação e o conhecimento podem ser encontradas em vários formatos – desde o tradicional em papel ao digital -, os leitores têm cada vez mais alternativas na hora de escolher “o que” e “onde” ler algo. “O computador modificou o processo informativo, tanto na sua faceta criativa como na de consumo” (Palomo, 2004:56). Neste sentido, tornou-se inevitável uma certa tensão entre os velhos media – imprensa escrita, rádio e televisão – e os novos media ou media sociais – como os blogues, redes socias, etc. Mas de todos os antigos media, é no jornalismo impresso que se sente mais essa inquietação, proporcionada pela expansão do digital nas redacções, mais forte nos últimos anos devido às inovações tecnológicas da Internet (Fidalgo, 2000). De acordo com Manuel Carlos Chaparro (2001:71) com estas inovações verificou-se uma transformação não só em Portugal, como por todo o mundo: “O milagre tecnológico da informação em tempo real roubou ao jornalismo impresso diário o encanto da novidade”. Os media tradicionais, nomeadamente a imprensa escrita, perderam assim terreno face aos novos media. Se por um lado estes traziam benefícios no que diz respeito a uma produção mais actualizada e vasta de informação (para não falar na possibilidade de convergência), podendo servir como complementos dos velhos media, por outro lado levaram a um excesso de conteúdos sobre os mesmos temas, muitos deles medíocres (Pavlik, 2005). No entanto, há que ter também noção que não são apenas os velhos media que procuram aproximar-se dos novos. Tal como chama a atenção Joaquim Fidalgo:
“Um dado, entretanto, convirá reter: se os “velhos media”, parecem sentir uma óbvia necessidade de se juntar aos “novos”, sob pena de perderem o comboio do futuro, também estes “novos” parecem precisar em alguma medida dos “velhos” para lhes resolverem o problema dos conteúdos, ou até facilitarem a chegada à casa das pessoas”(Fidalgo, 2000:3)
Os media sociais foram um marco para a mudança de papel passivo para activo do cidadão-comum no panorama comunicativo. Estes permitiram que qualquer cidadão-comum com acesso à Internet passasse de apenas leitor a também editor/produtor de conteúdos informativos. Este fenómeno verificou-se, particularmente, com o surgimento dos blogues, que na altura do seu boom, em 2003 (Gonçalves, 2012: s/p), foram vistos como um potencial substituto dos media:
“Não há dúvida, portanto, quando se afirma que os weblogs são uma alternativa de informação face aos grandes impérios midiáticos. Livres de limitações físicas, da demora das publicações convencionais e da pressão dos veículos de comunicação, os editores de blogues são independentes de tudo o que os impede de criar, por outras vias, uma nova opção de informação. Através da linguagem do webjornalismo, com seus links, recursos multimídia, a customização da notícia, a interactividade, o hipertexto, os editores desses diários estão contribuindo de forma significativa para a construção de um modelo informacional que sempre estará em constante metamorfose, junto com a velocidade dos avanços tecnológicos, do clique do mouse e dos microprocessadores” (Mattoso, 2003: 44).

 Alguns profissionais do jornalismo, como Inês Amaral (2006:1), apontam estes espaços como “o expoente máximo dos self media”. Com os blogues basta ter um dispositivo ligado à Internet para qualquer individuo fazer comunicação em massa, o que não é bem visto aos olhos de alguns profissionais legitimados. A razão para tal é a de alguns jornalistas mais conservadores defenderem que os novos media, em especial os blogues, são espaços sem códigos éticos e por isso não garantem a credibilidade das informações que publicam nem o respeito pelos seus leitores (Borges, 2007:42).

2.2.A blogosfera em Portugal
Foi em 1999 que surgiu o primeiro espaço, em Portugal, com as mesmas características do blogue (Querido & Ene, 2003) e com ele o primeiro blogger. “Nasce o “netcitizen”, o cidadão do mundo digital, à deriva na teia da Internet, com acesso ilimitado à informação e à auto-edição” (Amaral, 2006: 4). No mesmo ano surge a Blogger, primeira entidade a disponibilizar uma ferramenta de edição dos weblogues. Mas foi apenas em 2001 que apareceram os primeiros blogues nacionais ligados ao jornalismo, sendo alguns deles o Ponto Media (em Janeiro), de António Granado, o Jornalismo Digital, um blogue conjunto, e o Jornalismo e Comunicação (em Abril), um espaço colectivo do projecto Mediascópio. Em 2003, a Blogger é comprada pela Google e passa a oferecer o alojamento, popularizando assim a abreviatura “blog”. É também nesse mesmo ano que se assiste ao verdadeiro crescimento da blogosfera nacional, tendo aparecido nesta altura os blogues mais emblemáticos ainda hoje conhecidos; o “Gato Fedorento” e o “Meu Pipi” são alguns exemplos.
“A blogosfera portuguesa já mexia com mais de um milhar de editores a publicar numa base diária, mas faltava algo, um acontecimento de repercussão mediática, para lhe conferir a visibilidade que muitos reivindicavam e colocar os blogs definitivamente na agenda.” (Querido & Ene, 2003: 23)
Em 2003, nasce o blogue “O Abrupto”. A criação deste espaço de José Pacheco Pereira, por ser de uma figura pública tão mediática, deu um grande impulso à criação de mais blogues do género em Portugal. Este ano foi também assinalado pelo primeiro alojador português de blogues – o Weblog.com.pt – da autoria de Paulo Querido. O mesmo tinha como objectivo constituir uma alternativa lusa ao Blogger. Contudo, a ideia foi também levada a cabo pelo Sapo, que criou meses depois os blogues da Sapo (Silva, 2008). Foi no mês de Junho deste ano que deu-se um boom da blogosfera:
“Esta explosão trará inevitavelmente crises de crescimento. Haverá weblogs que não compreenderão o ambiente de crítica aberta que se vive na blogosfera, outros que não estarão preparados para persistir na exigente tarefa da escrita diária, outros ainda que se cansarão facilmente de escrever para leitores imaginários que nunca (ou quase nunca) aparecem - é bom nunca esquecermos que o acesso à Internet é ainda um privilégio de uma fatia muito estreita da população. Mas a pluralidade de vozes que esta explosão trouxe à Internet portuguesa só pode ser positiva, como é positiva a pluralidade de órgãos de comunicação social na esfera pública. Como acontece com outros sectores da sociedade, os mais bem escritos, mais interessantes, mais persistentes resistirão e ganharão cada vez mais credibilidade. Os outros desaparecerão sem deixar qualquer rasto. Será a selecção natural aplicada à blogosfera.” (Granado, 2003: s/p)  
O número de blogues portugueses era assim superior ao identificado em 2000. A visibilidade adquirida quatro anos depois do seu surgimento em Portugal, fez com que a atenção dos media tradicionais se focasse sobre eles (Silva, 2008). Esta situação pode ser justificada pelo facto de também figuras públicas, como já foi referido antes, aderirem ao blogue para exporem as suas ideias e devido aos seguidores que ganharam pelas suas características singulares: escrita intimista e crítica, livre de linhas editoriais, sem agenda e muitas vezes temática. Mas não só: o facto de muitos jornalistas começarem a usar estes espaços também suscitou medos entre os profissionais mais conservadores. É o que podemos ver na Revista Jornalismo & Jornalistas de Janeiro/Março de 2010, edição do Clube de Jornalistas, na qual um dos temas foi precisamente “Os media e a blogosfera: conflito em público?”:
“Se há quem alerte os jornalistas para acautelarem o que publicam nos blogues, há também quem sublinhe que a blogosfera é um espaço livre a que qualquer cidadão tem direito. De uma discussão mais vasta, cujos argumentos são frequentemente esgrimidos em público, parece emergir uma colisão das esferas pessoal e profissional e um embate entre velhos e novos media.” (Freitas, 2010:3)
Todavia, apesar dos receios, nos últimos anos vários media passaram a incluir blogues nos seus espaços online, os sites. Desde blogues próprios a blogues convidados, ainda hoje estes se encontram nos separadores de alguns deles, como é o caso do jornal Expresso e do PÚBLICO.
No entanto, depois deste rápido incremento e ampliação da blogosfera em Portugal, começou a evidenciar-se um novo fenómeno: o de muitos espaços mais antigos saírem dos serviços de alojamento e criarem o seu próprio domínio, adoptando um aspecto mais profissional e de site.
“O blog começou por ser pequeno, mas logo cresceu rapidamente, post a post, até ser aquilo que hoje é, um longo registo de pequenas recordações de duvidosa importância. Foi isto que o seu dono pensou, e ponderou até apagá-lo, mas era um homem muito esquecido, e o blog tinha uma memória extraordinária. [A moral desta história não oferece quaisquer dúvidas: se tens má memória, confia então na do teu blog.]” (Querido & Ene, 2003: 8)

2.3.Blogues: complemento ou alternativa?
Quase uma década depois do boom, ainda hoje existem muitos blogues dedicados ao debate de assuntos da actualidade (Querido, 2008). Seja de âmbito informativo ou mais de entretenimento, eles existem e continuam a ter leitores.
Em temos mais remotos, entre 2003 a 2007, altura em que por todo o mundo os blogues tinham mais força, chegou-se a pensar que este formato viria roubar o protagonismo aos media legitimados, apresentando-se como uma alternativa:A produção de conteúdo pode ser realizada por qualquer pessoa, e feita de qualquer lugar. Os números confirmam a crescente utilização dessa possibilidade, através do aumento dos usuários” (Mauad, 2009:7). Foram muitos os teóricos e profissionais da área que falaram nessa possibilidade. Sem linhas editoriais fixas, estatutos ou códigos deontológicos que os regessem, os blogues eram espaços com algo de novo a apresentar ao mundo. Ideias eram expostas a um ritmo alucinante, com o qual os media não podiam competir. Sem tabus ou interesses subjacentes, os autores destes espaços – desde meros indivíduos anónimos a figuras públicas - expunham os seus pareceres, que eram lidos por muitos leitores.
«Os blogues, pela actualidade constante da informação, pela possibilidade de participar, de opinar, traduzida numa autêntica democratização do espaço público. Este deixou de ser “monopólio dos jornalistas” (JV). Os blogues são citados nos jornais, despoletam investigação jornalística, como aconteceu recentemente com as habilitações académicas do Primeiro-Ministro, José Sócrates, alimentam polémicas intermináveis, contribuindo, assim, para roubar leitores aos jornais, ainda que este “roubo” deva ser matizado pois carece de estudos e análises científicas.» (Matos, 2007: 3)
No entanto, a imprensa escrita, em particular, tentou usar desde sempre os blogues como complementos do trabalho feito em papel e até no seu site. Muitos jornais generalistas adoptaram blogues, fixando-os nos seus espaços digitais. A seu ver criavam assim uma proximidade com os leitores, dando-lhes a possibilidade de, além da informação factual, poderem saber um pouco mais de um modo mais informal. Tentaram juntar o útil ao agradável com esta fusão. É com esta perspectiva de complementaridade que a investigadora Catarina Rodrigues (2006) concorda quando fala da relação entre os blogues e os media:
“Um blog pode funcionar enquanto dispositivo complementar da edição de notícias, através do qual é possível acrescentar novos dados e até discutir com o autor das mesmas, comentando-as. Neste caso, o blog seria uma acrescento à própria versão online do meio de comunicação relacionando-o com o público e criando interactividade com os leitores, aumentando o número de informação disponível sobre um determinado assunto” (Rodrigues, 2006: 67).
Mesmo que a sua popularidade tenha passado, o contributo dos blogues foi particularmente importante para o escrutínio da imprensa escrita, que até há uns anos não existia de todo. Quem o assegura é José Pacheco Pereira: “Mesmo quando não fornecem essa crítica de qualidade, [os blogues] tornaram a reflexão sobre os jornais inevitável e inescapável”( Pereira cit. em Matos, 2007:3).
No entanto, a substituição dos jornalistas por bloggers ou dos jornais por blogues é algo que nunca aconteceu e um assunto que, quando debatido, ainda gera divergências:
“Pensar os blogs como uma forma de jornalismo alternativo é, apesar de tudo, algo que ainda está longe de reunir consenso. Se, por um lado, é possível acrescentar num blog informação que não cabe nos media tradicionais, por outro lado, questiona-se se será ético usar informações recolhidas durante a actividade jornalística com outra finalidade a não ser a de servir o meio de comunicação para o qual se trabalha” (Rodrigues, 2006:70).

3.    Estudo de caso
3.1 Metodologia
Neste trabalho de investigação é importante identificar a metodologia e processos de análise que permitiram este estudo. Para começar, é necessário explicar que o estudo de caso foi a abordagem metodológica escolhida para procurar compreender o fenómeno complexo da blogosfera de cinema. Mas mais concretamente o papel dos blogues nacionais como meios de divulgação do cinema, problemática que surgiu no contexto do meu estágio, como já foi anteriormente explicado.
Se considerarmos as palavras do teórico João Pedro Ponte, percebemos, em linhas gerais, o que é exactamente o estudo de caso:
 É uma investigação que se assume como particularística, isto é, que se debruça deliberadamente sobre uma situação específica que se supõe ser única ou especial, pelo menos em certos aspectos, procurando descobrir o que há nela de mais essencial e característico e, desse modo, contribuir para a compreensão global de um certo fenómeno de interesse” (Ponte, 2006:2).
Neste sentido, percebemos como o tema em questão se adequa a esta metodologia, uma vez que é um assunto demasiado específico, pioneiro, podendo vir no futuro a contribuir para conhecer melhor a blogosfera e outros estudos do género.

Este estudo de caso será trabalhado sobretudo numa perspectiva qualitativa, com recurso à análise documental, a entrevistas e a questionários. 

Em primeiro lugar, como em qualquer investigação, foi indispensável perceber que tipo de dados bibliográficos mais generalistas, ligadas aos novos media e blogosfera, poderia usar para o enquadramento teórico deste estudo. Visto isto, passei à etapa seguinte, a de recolha de dados através da entrevista e questionário.

Foi através de instrumentos fornecidos pela análise de conteúdo categorial temática (Bardin, 1979) que examinei as entrevistas (de natureza semi-directiva) realizadas para este trabalho. Neste sentido, esta proposta de análise de dados permitiu-me evidenciar temas e opiniões comuns aos vários entrevistados – bloggers, entidades ligadas ao cinema e teóricos. Por isso, por opção pessoal, sempre que necessário, as informações apresentadas serão acompanhadas por exemplos através da transcrição de pequenos excertos das entrevistas. Estas foram realizadas na sua maioria através do e-mail, Skype, e chat, do Facebook e Gmail. O número de entrevistas foi relativamente numeroso, com o objectivo de tornar este estudo o mais completo e legitimo possível.

Para conhecer a história da blogosfera de cinema e o panorama actual, foram entrevistados individualmente 15 bloggers de cinema ainda activos, membros do grupo do Facebook, Bloggers Cinéfilos. Como critério usei o facto de fazerem parte deste grupo, porque assim tenho a certeza que são portugueses, e continuarem a ter blogues activos de diferentes gerações da blogosfera, delineadas por mim (uma do período 2003- 2007 e outra de 2008-2009), como veremos mais à frente. As entrevistas foram quase todas feitas à distância pelo facto de os bloggers serem de partes diferentes do país ou, em alguns casos, morarem mesmo fora dele, por questões laborais ou académicas. No entanto, foram realizadas entrevistas pessoais - a cinco bloggers, numa reunião informal, que teve lugar na Cinemateca Portuguesa de Lisboa, na altura em que elaborei a reportagem que deu origem a este estudo. A par destas entrevistas foi também realizada uma conversa conjunta no grupo Bloggers de Cinema, do Facebook, com o objectivo de esclarecer melhor os contornos desta comunidade. Foram ainda entrevistadas algumas pessoas ligadas ao cinema a fim de compreender a importância dos blogues para esta actividade: a directora da revista Empire, o director da revista Take, o director e fundador do festival FantasPorto, a directora de comunicação da produtora Lightbox, o director de marketing da distribuidora Columbia Tristar Warner e responsável pelo programa Cinemax. Finalmente, foi entrevistado o docente da disciplina de Ciberjornalismo, na Universidade do Minho, Sergio Denicoli.

Os inquéritos por questionário foram realizados em duas frentes (Quivy, 1998). Uma apenas dirigida a bloggers de cinema – os elementos do Facebook atrás referidos. Neste, 65 responderam ao inquérito, o que é um número bastante representativo, visto que o grupo tem cerca de 100 pessoas. Os demais inquéritos foram espalhados pela Internet com o auxílio da página do Facebook e do mail institucional da universidade. A este questionário, que pretendia saber qual o meio mais usado para ler sobre cinema, responderam um total de 72 pessoas.

Aproveitei a amostra de 65 pessoas também para analisar os seus espaços e classificá-los qualitativamente de acordo com três fases de evolução identificadas por mim: fase 1 – blogues primitivos, fase 2 – blogues híbridos e fase 3 – blogues profissionalizados. Esta classificação é importante para tentar explicar a minha opinião de que foi mais rápida a profissionalização dos blogues mais recentes.
(CONTINUA)

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Holy Motors: Sentem-se e viajem pelos olhos de Carax

21:55:00 Unknown 1 Comments

Uma crítica transversal a tudo o que existe ou não existe, desde a vida até ao cinema, esmagadora, poética, numa altura em que as máquinas são mais humanas que o próprio homem. Carax conseguiu assim brindar-nos com uma obra completa cinematograficamente, mas que para muitos parecerá sempre vazia por não ter uma narrativa linear e clara. É o não sentido da vida desdobrado em várias vidas, que culminam na ausência de uma, pelo menos para Oscar.

Um dos melhores do ano, na minha opinião. Ainda me faltam alguns, que considero importantes para visualizar, por isso, não posso já afirmar como o melhor. Deixo, no entanto, a promessa de tentar fazer uma critica mais decente e alongada, pois o filme merece.

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A Sabrina de Wilder e a Sabrina de Pollack

17:58:00 Unknown 0 Comments

Sabiam que um dos filmes mais conhecidos e acarinhados de Billy Wilder, "Sabrina" (1954), tem um remake homónimo, realizado em 1995? Senão sabiam, ficam a saber que ele existe e fazem parte do mesmo caras bem conhecidas como Harrison Ford e Julia Ormond, entre outros. 

Mas verdade seja dita, mesmo tendo nas rédeas Sydney Pollack, e sendo praticamente igual no que diz respeito ao argumento, o filme não tem metade do espírito do original, efeito, magia; perde-se indistinto no meio de milhares de outros filmes dos anos 90. Aliás, já o tinha visto pouco tempo depois de aparecer na tv, mas nunca, até hoje, dei conta de que tinha visto duas vezes a mesma história, apenas com poucas diferenças: os actores e a época em que se passa. Será pela ausência de Hepburn e Bougart? Ou por todo o conjunto que ficou perdido nos anos 50 e dificilmente conseguiria ser transportado para o mundo de hoje, de igual forma? A verdade é que não existe uma resposta para isso, contudo continua a ser um remake como muitos outros esquecido no tempo e sem grande relevância, enquanto que o primogénito continua a fazer sonhar cinéfilos por todo o mundo, como um dos preferidos de Wilder.

Trailer do filme original:

Trailer do remake:

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