Crítica | Her (2013), de Spike Karen Jonze.
É impossível não sentir, com "Her". Em cada cena, podemos encontrar um pouco de nós: daquilo que fomos, daquilo que somos e daquilo que seremos, enquanto humanos e seres relacionais.
Pela primeira vez, penso que Scarlett Johansson conseguiu chegar ao patamar de grande actriz. Surpreendentemente, apenas com a voz, "Her" é a sua melhor prestação. No entanto, é Joaquin Phoenix que incendeia e preenche a tela, a maior parte do tempo: desde o início até ao fim do filme. Por tudo isto, é terrível pensar como esta obra, e todos os seus elementos integrantes, tem sido deixado à revelia de nomeações que o distingam.
Spike Jonzen deixa mais uma vez o seu cunho. A introspecção. A necessidade de encontrarmos respostas; de nos encontrarmos a nós mesmos. O medo. A Ansiedade. A fúria. A luta interna. O querer fugir, sem sair do lugar. A incerteza de estarmos a viver a vida certa, com a pessoa certa, ou por outro lado, a dúvida de não sabermos o que seria o não o fazer.
Em "Being John Malkovich", em "Adaptation" e ainda "Where the Wild things Are", este realizador já deu mostras de conseguir transpor o ecrã, chegando directamente ao coração e mente do público. E em "Her" repete-o, tão bem, ao ponto de envolver o espectador, não apenas com o intuito deste seguir a história, mas, chegando a outro nível, em que o inclui emocionalmente na narrativa; fazendo-nos reviver as nossas próprias histórias.
É interessante o distanciamento possível e objectivo, mas, bem real, sentido entre as duas personagens. Inicialmente, tal como se ambas fossem fisicamente existentes no mesmo espaço, sentimos, percebemos e sorrimos com o 'teasing'; aquele inicio de romance, a paixão, em que tudo é natural, perfeito, com os seus defeitos e parece eterno. Depois, sentimos, o mundo real. Uma semiose de emoções toma conta de nós. Deixamos de ter apenas sensações positivas. O ar falta. Não temos certeza 'de onde nos encontramos'. O limbo, esse chamado amor ou suicídio dele, em que temos consciência de que deixamos de ser nós, para sermos parte de algo...Mas, tal como a estrutura que permite ao carro andar, uma relação apenas funciona se as pessoas 'se encontrarem', estiverem dispostas a lutar, funcionando, sacrificando os seus 'eus' em troca de um 'nós'. E, é aí, nesse exacto e ínfimo momento que percebemos que nada tem volta, que não podemos repetir, nem apagar, que inevitavelmente acabou. Aquilo que foi, agora já não é. Mudamos. Evoluímos. E de repente somos gigantes e, tal como começou, acaba, pois já não cabe dentro de nós. Contudo, algo perdurará para sempre, perdido no tempo, ou num espaço impossível de localizar; numa gaveta da nossa memória, colocada no limbo, em que contamos a nós mesmos essas mesmas histórias que um dia fizeram parte da nossa vida.
Apesar de poucas serem as personagens, o filme de Spike Jonzen é essencialmente sobre pessoas. Sobre os seus sentimentos e formas de se relacionarem. Sendo, para mim, um dos melhores do ano, ou até o melhor.
Em "Her" sofremos. Por nós. Pelas personagens. Pela humanidade. Nesse futuro que não parece ser muito distante, apresentado no filme, o mundo não será certamente um sítio muito diferente do que é agora, nem melhor. Aparte do aspecto pálido de todas as personagens, mais semelhantes a robots e mais apáticas, contrastando com a voz dos iOS's que parecem vibrar com um mundo que nunca poderão empiricamente conhecer.
As emoções continuam a ser, ainda, um dos nossos grandes desafios. Essas que não são controladas, nem mesmo nos mecanismos electrónicos, que passam a ser o nosso espelho, mesmo que num 'universo' não palpável. Um universo em que estamos todos igualmente sozinhos, isolados nas nossas ideias, em que amar pode significar o mesmo para todos e nada para ninguém. Em que podemos ser de alguém ou de ninguém. Onde nada faz sentido, fazendo. Em que não podemos contrariar a nossa própria natureza, a de mudar, deixando para trás quem não o fez...
Subimos para o telhado; escrevemos uma carta a quem sofreu por nós ou nos fez sofrer. Percebemos que o mundo não é assim tão linear, que por mais certezas que tenhamos, nunca teremos a verdadeira resposta.
A vida é apenas uma pequena caminhada, na qual somos efémeros. A alegria é talvez a nossa plenitude, que teimamos em não alcançar, sabotando-nos, alternadamente, até que no fim ficamos com nós mesmos, podendo finalmente descansar.
Adoravel o filme, critica profunda e detalhada sem expor os pontos chaves, parabens pela otima descriçao e por dividir com outros amantes de filmes e dos valores que os mesmos nos passam.
ResponderEliminarMuito obrigada, Fernando! :)
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