Crítica: «The Martian» e o renascimento de Ridley Scott

20:59:00 Unknown 2 Comments


Depois de uma série de filmes medíocres durante os últimos anos, de ressalvar o móvito denominado «Prometheus», Ridley Scott regressa do mundo dos mortos, como uma fénix. Das cinzas, conseguiu ressurgir mais forte, não tanto para fazer algo sequer igualável (ou inesquecível) a um novo «Alien» ou «Blade Runner», mas pelo menos inteligente e divertido. «The Martian» é um filme que ganha por ser despretensioso, dando um pontapé, daqueles dolorosos, a outros filmes do género criados, ao ‘déus dará’, nos últimos anos. Falo, portanto, de «Elysium», «Gravity», «Interstellar» e, claro, do mesmo criador, «Prometheus». Curiosamente, isto numa nota à parte, Matt Damon (também protagonista do novo filme) está presente em pelo menos dois dos enunciados, ilibando de algum modo o elenco de ser o culpado pela falta de qualidade dos referidos.

A fórmula do sucesso do recém-nascido de Scott provavelmente passa pela aposta numa abordagem mais divertida, não de forma exagerada, mas, precisamente, bem comedida e intercalada com momentos de alta tensão e drama. Assistimos Matt Damon (Mark Watney) a ir do ‘oito ao oitenta’ em segundos: entre a alegria de viver, frustração, resiliência, chegando mesmo a atingir um certo nível de insanidade, os estádios emocionais sucedem-se, acompanhados por um conjunto de acontecimentos, ora positivos ora negativos, não muito previsíveis. Por momentos, trocemos pela personagem e, apenas protegidos por uns óculos 3D, sentimos que estamos em Marte.


Neste filme, a “esperança” é a palavra de ordem e última a morrer. [SPOILER] A narrativa trata de um astronauta (Mark) que é deixado para trás pela sua equipa em terras marcianas, depois de um acidente durante uma forte tempestade que os leva a pensar que estaria morto. Mas, por ordem do acaso, algo de inesperado acontece e como por milagre, Mark sobrevive e fica sozinho em Marte. No planeta hostil, o astronauta, também botânico, vai achando diversas formas de conseguir manter-se vivo, dia após dia, com muito sacrifício e adversidades à mistura, até conseguir contactar a NASA [SPOILER].


Em cerca de duas horas intensas, mas também de diversão, Scott consegue apresentar-nos uma narrativa rica, onde a aventura, ação e ficção científica são misturadas e colocadas à prova pelo público.

Mas o filme tem também pontos negativos. Um deles é a sensação de deja vu despertada, quando vemos Jessica Chanstain e Matt Damon mais uma vez num “papel espacial”, tão pouco tempo depois de «Interstellar». No caso de Damon, o caso nem é tão grave porque sendo o protagonista e tendo uma personagem muito distinta acaba por conseguir redimir-se numa performance digna de entrar na corrida aos Oscares; já Chanstain desempenha uma personagem muito semelhante às precedentes, igualmente sem sal e unidimensional, ao lado de uma equipa apagada e apenas útil para duas cenas do filme – a inicial e a final. Outro ponto negativo é o “excesso de fita gafa espacial” e de outras soluções à la MacGyver que a dado momento deixam de ser divertidas ou credíveis, [SPOILER] como por exemplo quando fura o fato para conseguir chegar à equipa no espaço ou quando tapa um buraco na nave apenas com uma lona de plástico [SPOILER]. Bem, mas como se costuma dizer, é um filme de ficção científica (mesmo que não ache isso justificação suficiente por norma) e o resto da história sobrepõe-se em qualidade, além de que os cientistas, incluindo a própria NASA, aprovam o nível de fiabilidade do filme (como podem ver aqui), muito fiel ao livro homónimo de Andy Weir recomendado pela própria organização aos futuros astronautas como exercício de preparação.


De positivo, existe muito. É um filme para todos, um blockbuster que faz um bom uso do 3D (mesmo não sendo apologista), com visuais fantásticos. Na sua maioria tem vários pormenores científicos que respeitam a ciência e lógica, não entrando por caminhos muito complexos nem teorias que remetem a Deus vs. Homem, procurando antes apresentar uma história simples com um propósito bem delineado, que faz do público companheiro do protagonista numa incrível jornada. Porém, é preciso frisar que não é de modo algum um filme inócuo ou aborrecido por não enveredar por metáforas ou caminhos mais intrincados de existencialismo humano. Com essa abordagem (da qual confesso que já sentia falta) não deixa qualquer ponta solta, tecendo uma história perfeitamente coesa e animada por momentos alternados de tensão/comicidade, deixando tempo para desenvolver qb. a história. Outro aspeto interessante da película de Ridley é o de optar por um tratamento realista do futuro da relação entre o Homem e o Espaço, evitando cenários fantasiosos de robots assassinos ou seres de outro planeta que normalmente vemos nos outros filmes sobre os terráqueos no espaço. As cenas mais gore apresentadas também dão um toque da mão do realizador, que nos fez lembrar «Alien», onde o diálogo com o público é muitas vezes feito com o apelo às emoções por intermédio de imagens mais fortes e perturbadoras. Para além disto tudo, podemos dar um ‘tumbs up’ a «The Martial» pela reunião de um conjunto de atores tão diversificado, estando presentes algumas caras mais conhecidas do humor como Kristen Pigg (Annie Montrose) e Donald Glover (Rich Purnell) que, em vez de destoarem, dão um toque mais acessível e descontraído à história, desempenhando plenamente o seu papel.


«The Martial» não é o próximo «2001: A Space Odyssey», nem tampouco alguma vez o demonstrou querer ser. É, antes, a certeza de um serão de qualidade, que nos faz sentir, durante cerca de duas horas, noutro planeta, ao som de uma nostálgica playlist de outros tempos.

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2 comentários:

  1. Acho o filme divertido, mas vejo nele alguns problemas.
    Gostei daqui. Parabéns pelo Blog.

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    1. Sem dúvida que não é um filme perfeito, mas penso que estas produções comerciais tendem a não obedecer a esse nível de exigência, centrando-se mais em "iludir" o olhos do público entretendo-o. Obrigada Cecília Barroso pela sua visita, volte sempre.

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