Crítica: "Charade" (1963)

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Se para uns os anos 60 foram sinónimo do declínio de Hollywood, para outros as transformações sociais vividas nessa época pelo mundo obrigaram a indústria a dar espaço aos novos cineastas e ideias. Foi uma altura em que o cinema americano passou a ter novos rumos com a produção independente de baixos orçamentos, iniciada pelo realizador John Cassavetes. Por isso, não é de estranhar o surgimento de filmes que espelhassem isso, ostentados pelo comportamento jovem e metamorfismo. 

Mas, apesar do contexto vivido no sistema cinematográfico na época, isso não travou realizadores já consagrados, como Stanley Donen, de levar ao grande ecrã grandes clássicos - como é o caso de “Charade”, de 1963. Foi a simbiose de comédia, mistério e romance que o tornou um dos filmes mais lembrados da história do cinema e um dos mais famosos da filmografia de Donen; não esquecendo, todavia, outros como Singin' in the Rain ou Two for the Road. Porém não foi só o argumento escrito por Peter Stone e Marc Behm, que cativou e, ainda, cativa o público. Uma dupla-chave é a principal responsável. Audrey Hepburn e Cary Grant elevaram ainda mais a obra, que começa tão bem logo nos créditos animados, nada comuns para a sua época. 
Em Charade o suspense não é negativo. Apesar da tensão sentida, este estimula o público que anseia por aquilo que vai acontecer a seguir. Imprevisível e controverso, o filme faz com que o espectador siga a personagem de Hepburn (Regina Lampert), acompanhando-a enquanto esta foge de um trio de bandidos, que querem a fortuna do seu falecido marido, do qual, de forma inexplicável, Regina pouco sabe do seu passado. No entanto, o enredo não é assim tão linear e descomplexo. Uma outra personagem, Peter Joshua (Cary Grant) vem mudar e complicar aquilo que já parecia demasiado intrincado. E o resto pode ser visto na película, que além de surpreender ao longo de duas horas, passa a correr… Com prestações deliciosas de Grant-Hepburn, e com Paris como plano de fundo, o filme ficou também conhecido por conter influências de outros subgéneros: thriller de espiões, já pela sinopse percebemos isso; screwball comedy, surgida nos anos da Grande Depressão, com características muito semelhantes ao filme noir, mas que se distingue dele ao ter uma personagem feminina (Regina) como líder da relação da tela, desafiando constantemente a personagem masculina (Peter); e, por fim, whodunit (Who has done it?), caracterizado por ser uma variante dos filmes de detectives, onde a resolução do enigma da história é o ponto fulcral de interesse, sendo que o público adopta o papel de detective ao qual são dadas pistas ao longo da história.

De todas as características, e pela qual é mais conhecido, Charade é ainda hoje descrito como "the best Hitchcock movie that Hitchcock never made", sendo comparado a North by Northwest. Seja pela narrativa ou influencias, é difícil ficarmos indiferentes a uma obra tão completa e admiravelmente bem conseguida, pois mesmo não sendo sequencial, não se perde nos seus intentos, e faz com que o público se sinta parte integrante do filme, desde o seu início até ao seu fim.
Texto originalmente publicado no site Arte-Factos.

1 comentário:

  1. "The best Hitchcock movie that Hitchcock never made" é uma bela definição para este clássico. Basta comparar Charade com Roman Holiday para perceber como a química entre os actores faz toda a diferença, Audrey Hepburn e Cary Grant é uma dupla perfeita.

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