Entrevista Exclusiva: O pai do Cinemaxunga como o nunca leu

13:19:00 Unknown 9 Comments


Pela sua peculiaridade de aliar o escárnio, javardice e cinema de todos os géneros, com especial enfoque no "xunga", passado mais de 10 anos o Cinemaxunga é hoje um dos espaços mais caricatos e conhecidos da blogosfera; um verdadeiro «Auto da Barca do inferno» dos tempos modernos, a Bíblia e o Corão perverso que todos devem ler! Depois de vários anos a escrever e inovar com o lançamento de várias rubricas "duvidosas", mas bastante divertidas, Pedro é o autor que todos queremos ser. Ainda hoje contínua anónimo. Ainda hoje tem seguidores. Ainda hoje continua a escrever, fiel a si mesmo, sem cessar esforços, sobre aquele que é o seu "cinema" - o Cinemaxunga.



Sr. Xunga, existe ou é realmente apenas essa fotografia de um busto comunista semelhante ao D.Afonso Henriques?
Olá Mandim. Como sabes a minha especialidade é o deboche e não estava preparado para uma pergunta de cariz tão existencialista para começar. De facto penso e existo, ao mesmo tempo. Sou um homem normal, pai de família com 3 filhos muito jovens, marido atencioso, um family man com uma vida atarefada que pouco tempo deixa para ser um badalhoco na internet. Ainda assim, invisto o pouco tempo livre que tenho a falar de cinema e a ver filmes. Respondendo à tua pergunta, não sou um busto comunista.

(Agora a sério) Para começar, assim a frio, a pergunta pela qual todos esperam: o que o levou a criar o Cinemaxunga e a optar por esse nome?
No dia 23 de Junho de 2002 estava na minha casinha de solteiro deitado no sofá a ver um filme às 4 da manhã. Voltei-me para os meus colegas de apartamento e disse duas coisas: “Tenho que me levantar às sete e meia para ir trabalhar e ainda aqui estou” e “Este filme é tão horrível, não acham? Estão a borrifar-se? Ai é? A Internet há-de saber disto, amanhã começo um blog e eles vão temer a minha ira, irão querer dar-me milhões para que me cale, irão ameaçar-me de morte com medo da minha voz revolucionária, irão… zzzzz” e voltei a adormecer. E, de facto, no dia seguinte criei mesmo um blog. Ignorei a imensa lista de afazeres que tinha pela frente no meu trabalho e comecei a escrever. Destilei um pouquinho de ódio e o efeito não foi tão poderoso como imaginei nas minhas fantasias de Spider Jerusalem. O blog teve algum sucesso, dentro do seu nicho, e criaram-se grandes relações de amizade. Algumas delas ainda perduram, curiosamente. E foi neste espírito de excesso de auto-confiança que as coisas foram andando sem grande sucesso. Bom, e 13 anos depois aqui estamos. Praticamente no mesmo sítio.

Qual foi o filme mais "xunga", mas mesmo "xunga" que já viu em toda a sua vida e o fez desejar nunca mais tocar numa película, mesmo que esta fosse uma edição especial das Vixens?
Tudo depende do filme. Eu sempre defendi a teoria de que o sucesso de um filme se mede pela diferença entre aquilo a que o filme se propõe e aquilo que o filme atinge. Não podes criticar um filme de zero orçamento por não ter efeitos especiais decentes ou um filme porno por má representação e direcção de actorers. Posto isto, deixa-me que te diga que as piores desilusões têm normalmente a ver com filmes que confiámos, que criamos laços emocionais antes de os ver e no final parece que nos arrancaram o coração com uma concha da sopa porque o filme foi horrendo. Lembro-me do «Spawn» em 1997, numa altura em que a Internet era uma criança e andámos 6 meses a ouvir a banda sonora e a imaginar que iríamos ver o melhor filme de sempre. Deus nossa senhora nos acuda. Que fétido pedaço de fumegante estrume. Sei que pediste só um, mas dou-te mais alguns exemplos: «Planet of the Apes» do Tim Burton, tudo o que seja Adam Sandler ou o último Batman do Nolan que me pareceu 7 horas de agulhas a serem-me enfiadas debaixo das unhas (sei que não queres que fale em testículos, senão seriam 4 horas de lâminas a desfiar-me os testículos e depois 3 horas sentado dentro de uma bacia de álcool). Também me senti assim com o «Star Wars Phantom Menace», mas entretanto aceitei o filme como é e acabei por encontrar a paz.


A rubrica «Peitinhos da Quinta» é recordada com saudade por muitos cinéfilos...De todos os glândulos mamários que passaram pela sua exímia vista, qual aquele que destaca como detentor de "mais personalidade"?
O que queres dizer com “recordada com saudade”? Não há peitinhos todas as quintas, mas ainda os há de vez em quando. Serei sempre incondicionalmente fiel à Julliane Moore. Excepto se estiver com a Scarlet Johansen, Sofia Vergara, Mary-Louise Parker, Penelope Cruz, Vera Farmiga, Heather Graham, Nicole Kidman ou Jessica Biel. Ou os belos marmelos da Jamie Lee Curtis em meados dos anos 80.

De 1 a Monica Bellucci quanto dá ao filme «Comando»? Porquê?
Monica Belluci. E muitas vezes me pergunto isso a mim mesmo. Porquê? Porque é que gosto do «Commando» ao ponto de ser o filme que mais vejo sem me fartar? Em primeiro lugar é um filme fácil de se ver, elegantemente estruturado em níveis de videojogo, template que veio a ser adoptado daí em diante no que diz respeito ao filmezinho de bofetada. Em segundo lugar, porque tenho tendência a olhar para ele como olhei da primeira vez que o vi. Devo realçar que «Commando» é um filme que sempre me acompanhou. Desde que o vi no cinema que tenho um cópia comigo. Não daqueles filmes que viste com 12 anos e achaste espectacular e 300 anos depois voltas a ver e pensas “Yuck, como pude eu gostar tanto disto?”. E na altura em que o vi foi magia para mim. Eu sou velho, como sabes, e vi este filme na estreia com o meu pai. Ele começou a levar-me ao cinema desde tenra idade, mesmo antes de saber ler. Ora, há altura da estreia havia uma aura de “melhor filme de todos os tempos” para o «Commando» e uma criança de 12 ou 13 anos fica marcado quando vê uma besta sobre-humana a matar, degolar e decepar, como Arnie o fez naquele filme. E esta sensação acompanhou-me e, hoje em dia, estas coisas todas associadas fazem-me achar este filme como aquele que consigo ver mais vezes sem me fartar. Tenho noção que não é uma obra-prima, não é sequer o mais perfeito e conceituado filme de acção. Só que para mim é e isso chega-me.



DVD ou cassete? (Por favor, não use o termo VHS)
Nem DVD nem “cassete”. Neste momento sou fã do streaming e formato digital. Só que VH…erm.. a cassete transporta consigo todo o imaginário da minha juventude, do pico da minha felicidade enquanto ser humano. O ritual é importante nas questões da cinefilia e perdeu-se esse ritual que servia de ante-câmara sensorial para a correcta apreciação de uma obra. Hoje é imediato e passado um bocado já estás a ver outro sem digerir o anterior. Não te permite fazer aquelas avaliações complexas que antes se fazia acerca de um filme. Os críticos e bloggers bem tentam, mas não têm sequer o ambiente para que isso aconteça. Há muito ruído sensorial para que a pessoa possa saborear o pós-filme em paz. O ritual da cassete também era forte. Tinhas que ir alugar um filme, passar umas horas a discutir com a namorada ou os amigos e depois chegar a casa e apreciar a cacofonia de criticas porque o filme que escolheste é/era uma bela merda. Claro que isto é só um exemplo. Criava-se uma identidade e uma capacidade mais madura para apreciar coisas. Hoje tens mil filmes à mão, não queres ver nenhum, sacas um que toda a gente fala, passas o filme todo ao telemóvel, facilmente te deixas influenciar pelo que dizem as outras pessoas acerca do filme. E cria-se um gosto colectivo que não representa bem o individual. Às vezes as pessoas até se sentem estúpidas porque gostaram de um filme que tem rating 4 no IMDB. Mas o cinema e a arte são assim, não podemos gostar todos do mesmo e isso é saudável.

São muitos os filmes da década de 80/90 - e não estou a falar dos Porky's - que visualiza e partilha frequentemente na sua página...Existe alguma razão em especial para isso ou é apenas um fetichista de calcinhas de cintura subida?
A razão pela qual os partilho não é porque os comecei a ver agora e fiquei deslumbrado. São os filmes com que cresci. Eu já vejo cinema de modo consciente há uns 30 anos. E as pessoas vão ficando cada vez menos impressionadas ao longo do tempo. Tenho a teoria de que a melhor época cinematográfica do cinema americano é sempre a década em que nascemos. No meu caso, que nasci em 1973, considero esta a época de ouro de Hollywood. Aliás, até considero o ano de 1973 um dos melhores anos de sempre em cinema. Mas os anos 80 foram bem divertidos em cinema. Além disso revejo muitos filmes dessa era porque começam a sair agora em qualidade de alta definição, digitalizados directamente da película com aspecto fabuloso. Um exemplo disto são os western spaghettis que eram vistos em cinemas de praia em cópias todas carcomidas, cheias de sujidade e cabelo e agora aparecem com uma qualidade de imagem superior a filmes recentes. Tudo isto merece ser revisto.

Esta é para o seu consultório: Hoje li em algum sítio que alguém dizia que o cinema comercial estava cada vez mais inócuo. Concorda?
As audiências têm vindo a mudar e cada vez mais os frequentadores de cinemas são jovens com pouco interesse em qualidade, preferem o fogo de artificio e os tambores a mil decibéis, coisas esquecíveis. O cinema comercial é feito para agradar à audiência e como tal o que se tem agora é isso. Filmes de acção despidos de alma e aguados para maiores de 13 (para os putos), comédias românticas para os casais (para as gajas, vá!) e os filmes animados que hoje em dia nunca saem das salas (antes era só natal e verão). Ou seja, oco e de que maneira.

Se pudesse eliminar um género cinematográfico, qual seria?
A comédia romântica. Porque na realidade é só um filme copiado à exaustão. Ora repara. Rapaz e rapariga com baixa compatibilidade conhecem-se sob pretexto suspeito ou por um interesse obscuro. Começam a conhecer-se bem e a amar-se. Ao final do segundo acto um deles (normalmente a gaja) descobre o porquê da relação ter sido iniciada (o pretexto manhoso) e fica furiosa. Sai de casa. Ele fica desolado. Normalmente à chuva com uma balada dos Aerosmith. Decide recuperar o amor. Oh não, ela vai deixar o país. Corre pelo aeroporto adentro e numa tropelia desastrada cai-lhe à frente. Faz um monólogo inspirador capaz de humidificar a lábia à Madre Teresa. Ela tem dúvidas. As pessoas à volta incitam ao amor.O Amor tudo vence. Fim. Música animada e festiva.


Atualmente evidenciamos a conversão de vários blogs em páginas de Facebook devido à perda de público e à hegemonia das redes sociais junto deste. Como blogger há já alguns anos, acha que é este o futuro da blogosfera e do Cinemaxunga?
Eu detesto o Facebook. Todos os bloggers o detestam. Roubaram o público aos blogs, moldaram as pessoas a lerem apenas textos pequenos e a divertirem-se com banalidades. Eu sei que é um cliché, mas neste momento o Facebook é a Matrix, as pessoas todas ligadas a partilhar frases merdosas de gurus farsolas, a rir de gatinhos, indignados com cães que passam fome e completamente insensíveis à miséria humana, envolvidas em causas que desconhecem a fundo, a fazer likes em links que não lêem, a ignorar tudo o que tenho mais que 160 caracteres. O Facebook é o cancro do mundo e a ferramenta final de controlo de populações. Sim. é o pior que podia acontecer aos blogs.

Michelle Pfeiffer ou Kim Basinger?
Kim Basinger forever.

Estes dias criaste uma fundação, para resgatar filmes perdidos, chamada FuFA (Fundação do Filmezinho Abandonado) e antes o blogue Cinemaxunga... Evidencio um padrão de escolha de nomes que não atraem público generalista, posto isto porque não escolhes nomes mais apelativos às massas?
Ao longo do tempo, percebi que as únicas pessoas que me liam era malta que ia vindo pelo passa-palavra. Pessoas que vinham pelo conteúdo e que estavam imunes ao nome. O nome Cinemaxunga sempre serviu para afastar fãs indesejados. É apenas um nome. Quem não sabe o que é não vem porque desconfia do nome. Só cá está quem conhece e quem interessa. Com o FuFA é a mesma coisa. Eu tenho vida feita, um rumo definido para as minhas coisas pessoais. Não estou à espera da fama e da glória. Nunca irei largar o meu emprego e dedicar-me a isto. Assim, mesmo que numa improvável reviravolta do destino, se algum dia atingir alguma fama nenhum meio respeitável de comunicação vai promover nomes como FuFA ou Cinemaxunga. Afasta aqueles haters do Facebook que aparecem só com aquele pensamento de “esta gajo pensa que é bom, eu já o fodo.”... É como aqueles bares pequenos e confortáveis com lotação muito limitada.


Por fim, a pergunta pela qual todos esperavam a seguir à primeira pergunta pela qual todos esperavam: Algum dia vai revelar a sua identidade secreta?
Nunca. Por uma única razão. Eu comecei a escrever no Cinemaxunga em 2002. Tinha já quase 30 anos. Com o tempo fiz muitos amigos, muitos leitores, juntei bastantes pessoas em redor das minhas imbecilidades. Alguns vão, voltam outros mais jovens e o ciclo continua. Apesar de ter ainda acesso a amigos que me acompanham desde inicio, o certo é que a maior parte são jovens entre os 20 e os trinta e poucos. E eu tenho 41, sou casado, tenho 3 filhos, um emprego de pai. Uma vida banal. Nada da minha vida pessoal tem em comum com o freakshow ambulante do Cinemaxunga. Seria uma desilusão para todos. Para mim e para os outros. Ainda há uns dias estive com um Facebook friend que me deu umas cassetes que ia para deitar fora. Quando fui ter com ele disse-me que achava que eu fosse mais novo. É natural. Os mundos não são compatíveis. Mandarei, no limite, fotos da gaita a jeitosas que peçam com jeitinho. E com este belo pensamento vos deixo. Boas noites e bons sonhos.

9 comentários:

  1. Momento histórico da blogosfera nacional. Hail Cinemaxunga!

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  2. Sem dúvida que foi um entrevistado interessante e merece o destaque ;)

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  3. Adorei. Grande entrevista. Grandes respostas.

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  4. a entrevista está óptima. parabéns a entrevistadora e entrevistado :)

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  5. Esse pensamento sobre a década mais relevante para cada um de nós faz-me algum sentido. Para mim, nascido em 1980 é-me difícil não absorver tudo o que é filme dessa década. Pancadaria, o slasher, o sci-fi de qualidade duvidável... ahhhh!

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  6. Ótima entrevista! O Cinema Xunga é um blogue que sigo sempre com atenção. Totalmente de acordo em relação à extinção das comédias românticas de preferência com uma bazucada do Chuck Norris! Quanto ao sentimento do entrevistado sobre o filme "Commando" eu tenho também algo semelhante com outro filme emblemático dos anos 80: "Cobra" com Sylvester Stallone. Nunca me canso de o rever!

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May the force be with you!